No seu ciclo histórico, o cacau projetou o Brasil no exterior por ser a matéria-prima de um dos alimentos mais consumidos e adorados no mundo: o chocolate! As cores da casca do cacau, que variam nas tonalidades de amarelo, laranja e vermelho, escondem um delicado amontoado de amêndoas revestidas por polpa esbranquiçada. O processo de fermentação das amêndoas é o que dá o sabor mais ou menos requintado ao chocolate e que também produz os chamados flavanóis, que pertencem ao grupo dos flavonoides, e que têm conhecida ação anti-oxidantes.
Após a secagem e a torra das amêndoas para extrair a manteiga e os outros produtos do cacau, restam apenas 10% da quantidade de flavanóis. Comparado com as versões ao leite, as apresentações de chocolate amargo são as que mais tem flavanóis, na forma de catequina e de epicatequina. Mas será que consumir chocolate amargo faz bem para o coração?
Embora alguns estudos tenham mostrado que o consumo de chocolate amargo pode estar associado a menor incidência de infarto do miocárdio e acidente vascular encefálico, esse achado não foi confirmado. O que se sabe é que o consumo diário de grandes quantidades de flavanóis, cerca de 900 mg por dia, pode resultar em maior relaxamento das artérias e redução da pressão arterial e consequentemente isso poderia ser benéfico para algumas pessoas. O problema é que para se obter essa quantidade, teria que se consumir cerca de 300 gramas de chocolate amargo de ótima origem por dia. Mesmo para um "chocólatra", seria muito difícil manter esse consumo de chocolate amargo por muito tempo. Além disso, nem sempre consumimos as melhores versões de chocolate amargo e os rótulos ainda não informam as quantidades de flavanóis. Mas será que o que compramos realmente é um chocolate amargo de boa qualidade? Para isso, é preciso entender como ele é feito...
As amêndoas do cacau, depois de fermentar e secar, são torradas e submetidas a um processo para separar a manteiga de cacau. O que resta é moído para formar o pó do cacau que conhecemos. É chamada de liquor de cacau a massa que é feita do pó com a manteiga. Para fazer o chocolate, utiliza-se o licor e se acrescenta açúcar. O chocolate é considerado amargo se tem pelo menos 70% do cacau (pó mais manteiga de cacau). Mas aí é que está o detalhe importante. Num chocolate 70% de cacau, por exemplo, o correto seria ter 70% do liquor. Mas na maior parte das vezes, para reduzir custos, não é isso que ocorre. Muitas vezes, quando faz um chocolate chamado de 70%, a indústria usa na maior parte o pó do cacau e complementa com outros tipos de gordura que não só a manteiga de cacau, como a hidrogenada. Isso é feito para reduzir o custo, já que a manteiga de cacau é uma matéria-prima muito nobre e cara, utilizada em cosméticos, produtos farmacêuticos e alimentos. Entendeu a diferença?
A maioria dos que se dizem "chocólatras" e que não conseguem viver sem o chocolate, na verdade gostam mais do chocolate ao leite, que é rico em gordura e açúcar. Fique atento quando for comprar o seu chocolate amargo. Vale a pena ler o rótulo para saber como ele foi feito. Uma dica: um bom chocolate amargo nunca é barato, pois tem a manteiga de cacau. Outro lembrete: o chocolate branco é o pior, pois não tem nada do pó da amêndoa e certamente o que menos tem é manteiga de cacau. Se você gosta de chocolate, sempre procure consumir o amargo e de boa qualidade. Leia o rótulo. Vá acostumando o paladar, sorvendo em pequenas quantidades e aos poucos. E o mais importante, sem culpa!
Referência:
Vlachojannis J, et al. The Impact of Cocoa Flavanols on Cardiovascular Health. Phytother Res. 2016.
Dr. Eduardo Guimarães Camargo
Médico Endocrinologista
CREMERS 23.404 - RQE 17.086
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