domingo, 30 de outubro de 2016

Dieta do hCG: mais uma dieta que pode colocar sua saúde em risco

Todo dia surge uma nova dieta prometendo acabar com o excesso de peso e uma dessas “dietas da moda” é conhecida como "dieta do hCG". Mas será que essa dieta funciona? É segura? Então vamos lá... 



Antes de mais nada, o que é o hCG?
O hCG ou gonadotrofina coriônica humana é um hormônio produzido pela placenta e que pode ser encontrado na urina e sangue de mulheres grávidas. Na medicina o uso desse hormônio é aprovado para o tratamento de infertilidade feminina, criptorquidismo, hipogonadismo hipogonadotrófico em homens e puberdade tardia em meninos. Esse hormônio não é e nem nunca foi aprovado para perda de peso!! 

Mas há várias pessoas defendendo o uso do hCG para perda de peso, será que ele não é bom para isso?
NÃO! Existem vários estudos confiáveis e de alta qualidade que mostram claramente que o hCG não é eficaz na perda de peso. Além disso, o hCG não deve ser vendido como um suplemento alimentar ou nutracêutico. Ele deveria estar disponível somente mediante prescrição médica e para uso apenas nas situações descritas anteriormente.

E como funciona a dieta do hCG?
A dieta do hCG não é nova. Ela foi proposta ainda nos anos 1950 pelo médico britânico Albert Simeons. O dr. Simeons dizia que os pacientes que faziam a sua dieta perdiam uma proporção maior de gordura do que músculos durante o processo. Ele acreditava que a gordura era mobilizada da região abdominal, quadris e coxas. Além disso, afirmava que seus pacientes sentiam menos fome e irritação durante a restrição de calorias. Nesta dieta, além do uso do hCG, por via oral ou injetável, o paciente é submetido a uma restrição extrema de calorias: apenas 500 kcal/dia. Com certeza o emagrecimento vem da restrição calórica e não da administração do hCG. Para se ter uma ideia do quão severa é a restrição energética, nem mesmo pacientes com obesidade mórbida são recomendados a consumir menos de 800 kcal/dia. Visto que 500 calorias não são suficientes para manter as funções básicas do organismo, após um tempo, o metabolismo cai para tentar conservar as calorias, já que o corpo interpreta a dieta como um estado de inanição. O metabolismo reduzido, posteriormente, resulta em reganho rápido do peso perdido, quando o indivíduo retoma a ingestão calórica normal.

Mas o que as evidências científicas dizem sobre essa dieta?
Uma metanálise (técnica estatística especialmente desenvolvida para integrar os resultados de vários estudos independentes sobre uma mesma questão) de 24 estudos, publicada em 1995, avaliou o efeito do hCG sobre a perda de peso comparando pacientes que fizeram uma dieta restritiva e usaram o hormônio contra pacientes que fizeram uma dieta restritiva e que não usaram o hormônio, e concluiu que: “não há evidências científicas que demonstrem que o hCG cause perda de peso, redistribuição de gordura corporal, reduza a fome ou induza sensação de bem-estar. Portanto, a utilização do hCG deve ser considerada como uma terapia inadequada para a perda de peso".
Em 1975, o FDA (órgão do governo dos Estados Unidos que tem a função de controlar os medicamentos através de diversos testes e pesquisas) afirmou que o hCG não tem nenhum benefício no tratamento da obesidade. Em 2009, diversas sociedades médicas americanas publicaram um documento não recomendando o hCG como terapia para perda de peso. No Brasil, sociedades médicas sérias como a SBEM (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia) e a ABESO (Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica) também desaprovam a prescrição do hCG para fins de emagrecimento.

E quais são os riscos de usar hCG?
- Tromboembolismo arterial e venoso (coágulos de sangue que podem obstruir artérias ou veias, provocando infarto, derrame cerebral ou embolia pulmonar); 
- Sintomas do sistema nervoso central (dor de cabeça, irritabilidade, agitação, depressão, fadiga, comportamento agressivo, insônia);
- Reações de hipersensibilidade e nos locais de injeção (dor, coceira, edema, infecção). 
- Possibilidade de aumentar a incidência de cistos ovarianos. 
- Ginecomastia (aumento de mamas) em homens
- Possibilidade de promover desenvolvimento tumoral se administrado em pessoas que tenham câncer hormônio-relacionados, tais como o câncer de próstata, endométrio, mama, ovário.

Em resumo, o hCG NÃO promove perda de peso ou de gordura adicional, NÃO reduz a sensação de fome, NÃO melhora a irritabilidade ou aumenta a sensação de bem-estar e NÃO é considerado um método seguro de emagrecimento. 
Entendemos que a perda de peso possa ser frustrante, mas nunca adote estratégias "milagrosas" e que, pior do que isso, colocam sua saúde em risco! Esta dieta não faz nada para alterar os hábitos que levam ao ganho de peso, Procure um profissional sério e competente que possa te acompanhar e orientar a perder peso de forma saudável e segura.

Fonte:
1. Lijesen GK, Theeuwen I, Assendelft WJ, Van Der Wal G. The effect of human chorionic gonadotropin (HCG) in the treatment of obesity by means of the Simeons therapy: a criteria-based meta-analysis. Br J Clin Pharmacol. 1995 Sep; 40(3): 237–243.
2. Goodbar NH, Foushee JA, Eagerton DH et al.  Effect of the Human Chorionic Gonadotropin Diet on Patient Outcomes. The Annals of Pharmacotherapy 2013 May, Volume 47.
3. Bray GA. Obesity in adults: Drug therapy. In UpToDate, literature review current through: Sep 2016.

Dra. Fernanda Meneghini Fleig
Médica Endocrinologista
CREMERS 33.785 - RQE 28.970

Consequências do abuso de esteroides anabolizantes

O uso de esteroides anabolizantes androgênicos (EAA) está cada vez mais difundido, principalmente entre praticantes de atividade física e atletas. As principais causas apontadas para o uso de anabolizantes incluem: insatisfação com a aparência física, baixa autoestima, pressão social, o culto pelo corpo que a nossa sociedade tanto valoriza e a falsa aparência saudável. Estudos estimam que um número tão alto quanto 30% dos praticantes de academia abusam ou já abusaram do uso de hormônios para tal fim. Uma parcela não desprezível dos usuários tem uma percepção equivocada de que o uso de EAA é seguro ou que os efeitos adversos são controláveis, o que é um verdadeiro erro. Os esteroides anabolizantes oferecem riscos graves à saúde física e mental.



O uso de EAA compreende o abuso de testosterona e seus derivados. A testosterona permanece ainda como o EAA mais popular devido ao seu baixo preço, acesso relativamente fácil e dificuldade de distinguir, em exames de sangue, a testosterona exógena da endógena. Segundo o Comitê Olímpico Internacional (COI), doping é definido como o uso de qualquer substância endógena ou exógena em quantidades ou vias anormais com a intenção de aumentar o desempenho do atleta em uma competição. No Brasil, os EAA foram considerados agentes dopantes a partir de 1985, segundo publicado na Portaria 531, de 10 de julho de 1985.  Na medicina, o uso da testosterona está indicado em alguns casos bem específicos, como no hipogonadismo masculino (situação em que os homens deixam de produzir ou produzem testosterona em menor quantidade do que o normal), alguns casos de transsexualismo e sarcopenias. 
Os efeitos dos EAA sobre o comportamento dos usuários há muito tempo têm sido pesquisados, assim como os vários efeitos adversos em diferentes órgãos e sistemas do corpo (vide tabela abaixo). Além disso, já está comprovado que os EAA podem induzir efeitos sobre o sistema de recompensa do cérebro, o que pode tornar os usuários  mais suscetíveis ao abuso de outras drogas. Normalmente os usuários de EAA usam hormônios em doses extremamente elevadas, aumentando ainda mais os risco!

EFEITOS CARDIOVASCULAR
- Dislipidemia (alteração dos níveis de gordura no sangue)
- Doença aterosclerótica (formação de placas dentro dos vasos, podendo levar à infarto cardíaco e derrame cerebral)
- Cardiomiopatia (aumento do músculo cardíaco, prejudicando seu funcionamento)
- Arritmias
- Anormalidades de coagulação
- Hipertensão Arterial
NEUROPSIQUIÁTRICOS
- Distúrbios do humor e depressão, inclusive com relatos de suicídio
- Comportamento agressivo e violento
- Alteração cognitiva e de memória
- Dependência de EAA
- Aumento do abuso de outras drogas


MUSCULOESQUELÉTICO
- Fechamento prematuro das cartilagens de crescimento (adolescentes), prejudicando crescimento
- Ruptura de tendões


RENAL
- Falência renal secundária à rabdomiólise (lesão muscular)
- Glomeruloesclerose (fibrose no rim, prejudicando seu funcionamento)
- Câncer renal
PROBLEMAS HORMONAIS - HOMENS
- Supressão de hormônios importantes na produção endógena de testosterona (hipogonadismo), levando a perda de libido, distúrbios de ereção, atrofia dos testículos
- Ginecomastia (aumento das mamas)
- Aumento da próstata
- Câncer de próstata
- Infertilidade


PROBLEMAS HORMONAIS – MULHERES
- Supressão de hormônios importantes na produção endógena de estrogênios, levando a distúrbios da menstruação
- Infertilidade
- Atrofia das mamas
- Excesso de pelos e alopecia (perda de cabelo do couro cabeludo)
- Aumento do clitóris
- Alteração da voz (IRREVERSÍVEL)


DERMATOLÓGICO
- Acne
- Estrias
- Excesso de pelos e alopecia (perda de cabelo do couro cabeludo)
HEPÁTICOS (fígado)
- Inflamação e colestase
- Hepatite
- Câncer de fígado

Como podemos ver na tabela acima, os EAA são drogas que podem provocar efeitos colaterais gravíssimos. Ainda assim, os usuários de EAA continuam usando tais substâncias de maneira desenfreada, sem considerar os efeitos colaterais ou julgando, erroneamente, que os benefícios são maiores do que os riscos. Testosterona só deve ser usada, em doses adequadas, se há uma necessidade clínica que justifique seu uso! 
Médicos sérios e éticos não compactuam com o uso de anabolizantes para fins de melhorar desempenho ou forma física. Se você quer melhorar seu desempenho físico ou composição corporal, procure uma equipe multidisciplinar, composta por médicos, nutricionistas e educadores físicos, buscando adequar sua dieta e rotina de exercícios para atingir o seu objetivo!

Fontes:
1. Pope HG Jr, Wood RI, Rogol A, et al. Adverse health consequences of performance-enhancing drugs: an Endocrine Society scientific statement. Endocr Rev 2014; 35:341.
2. Nieschlag E., Vorona E. Medical consequences of doping with anabolic androgenic steroids: effects on reproductive functions. European Journal of Endocrinology 2015; 173, R47–R5.
3. Snyder,PJ. Use of androgens and other hormones by athletes. In: UpToDate, literature review current through: Sep 2016.

Dra. Fernanda Meneghini Fleig
Médica Endocrinologista
CREMERS 33.785 - RQE 28.970

Suplementos de cálcio e vitamina D na osteoporose: devo parar?

O mês de outubro de 2016 está chegando ao fim, mas nos trouxe duas importantes publicações sobre o uso de suplementos de cálcio e vitamina D (Ca+vitD) no tratamento da osteoporose. Nos últimos anos, questionamentos sobre o efeito e a segurança dessas medicações  fizeram muitas mulheres interromperem os seus tratamentos. As duas perguntas que mais ouvi no consultório: 1)"Se tenho osteoporose, realmente preciso usar suplementos de Ca+vitD? Já estou usando aquele ‘outro’ comprimido uma vez por semana ou uma vez ao mês (alendronato, risendronato, ibandronato).” 2) “Ouvi dizer que usar Ca+vitD pode calcificar minhas artérias e aumentar o risco de infarto do coração e estou com dúvida se devo manter o uso. É verdade?”



A primeira pergunta foi respondida pela European Society for Clinical and Economic Aspects of Osteoporosis, Osteoarthritis and Musculoskeletal Diseases e pela International Foundation for Osteoporosis em artigo na revista Osteoporosis International.  O uso de suplementos de Ca+vitD auxilia na redução do risco de fraturas em mulheres com osteoporose e deve ser mantido, principalmente naquelas com alto risco de fratura (idade maior que 65 anos; fratura prévia; uso crônico de corticoides; história de fratura na família; peso abaixo de 58 quilos; fumante; consumo excessivo de álcool) e naquelas que tenham níveis baixos de cálcio e/ou de vitamina D. Recomenda-se sempre o uso de cálcio associado a vitamina D e não de forma isolada. Além do mais, o uso diário de vitamina D está associado a uma diminuição do risco de quedas e pode ser importante na prevenção de fraturas. A dose recomendada é de até 1200 mg por dia de cálcio e 800 UI por dia de vitamina D. Para que funcione bem, o uso de alendronato e similares exige que o corpo esteja bem suprido de cálcio e vitamina D. Portanto, não pare de usar esses suplementos sem conversar com o seu médico! Outro ponto importante: não adianta usar suplementos de Ca+vitD para prevenir a osteoporose antes do tempo ou para aumentar a massa ósseo, como se vê muitas mulheres jovens usando. Não se deve esquecer que esses suplementos podem aumentar o risco de cálculos renais e causar efeitos gastrointestinais indesejáveis, como dor na barriga e intestino preso.
Em relação à dúvida sobre  o risco de suplementos de Ca+vitD causar infarto, a National Osteoporosis Foundation, dos Estados Unidos, e a American Society for Preventive Cardiology esclarecem, em artigo publicado na conceituada revista Annals of Internal Medicine: não há evidências científicas que possam associar o consumo de cálcio e vitamina D dentro dos limites recomendados com infarto do coração, isquemia cerebral ou morte. A suplementação de Ca+vitD deve ser mantida sempre que necessária para saúde dos ossos. A história de que esses suplementos podem “calcificar as artérias” não é verdade. Portanto, se seu médico prescreveu, pode usar com tranquilidade.
É sempre bom compartilhar boas notícias, não é mesmo?


Dr. Eduardo Guimarães Camargo
Médico Endocrinologista
CREMERS 23.404 - RQE 17.086

quarta-feira, 26 de outubro de 2016

Vale a pena suplementar iodo para tireoide?

Alguns modismos são potencialmente perigosos. A suplementação de iodo com a intenção de prevenir doenças tireoidianas, na grande maioria das vezes, causa mais prejuízos do que benefícios a saúde. Pessoas com disfunções leves ou nódulos, principalmente se não diagnosticados, correm risco ainda maior de enfrentar problemas causados pelo uso indevido de iodo. Vamos entender por quê...



O iodo é considerado um micronutriente com distribuição variável na crosta terrestre. Isto quer dizer que em algumas regiões geográficas, especialmente áreas montanhosas e regiões afastadas do litoral, podem ser carentes de iodo. Nossa tireoide usa cerca de 52 mcg (1000 mcg equivalem a 1 mg) de iodo todos os dias para fabricar o T4 (65% do peso em iodo) e o T3 (59% do peso em iodo). Para garantir o aporte correto deste nutriente, é recomendada uma ingestão diária de iodo de 150 mcg para adultos, 220 mcg para gestantes, 290 mcg para mulheres amamentando e 90-120 mcg para crianças de 1 a 13 anos de idade. Em nosso meio, a principal fonte de iodo é o sal de cozinha. No Brasil, por lei, cada quilo de sal possui de 15 a 45 mg de iodo. Esse valor foi ajustado no ano de 2013 (antes, cada quilo de sal tinha de 20 a 60 mg de iodo), após estudos em que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) detectou ingestão excessiva deste micronutriente no nosso país. Além do sal de cozinha, o iodo também pode ser encontrado em frutos do mar, em algas e em alguns medicamentos como a amiodarona, por exemplo. Suplementos a base de iodo como a solução de Lugol e a SSKI possuem quantidades astronômicas de iodo! Enquanto uma gota de Lugol tem 6,35 mg, uma gota de SSKI tem 38,5 mg de iodo. Ou seja, uma gota de Lugol possui 42 vezes mais iodo do que o recomendado (!) e uma gota de SSKI, 256 vezes (!!!). Definitivamente, nossa tireoide não precisa de tanto iodo! E o pior, pode ficar doente com esse excesso.
Um dos motivos de não necessitarmos de tanto iodo é a autorregulação tireoidiana. Graças a este mecanismo, a tireoide consegue manter a produção de hormônio na medida certa se não houver carência grave de iodo ou doença na glândula. As células da tireoide quando expostas a grande quantidade de iodo param de captá-lo e diminuem a produção de hormônio. É o efeito Wolff-Chaikoff. Dentro de algumas semanas, em pessoas saudáveis, há um escape e a tireoide retorna a captação do iodo para manter a produção de hormônio constante. Em outras palavras, não adianta fornecer iodo demais. A tireoide usa até um limite e o excesso é ignorado, a menos que haja problemas com ela...
Em pessoas com doença na tireoide, mesmo que não diagnosticada, o excesso de iodo é capaz de causar problemas. Quando há bócio endêmico ou nódulos autônomos, o excesso de iodo ofertado é captado e transformado em mais hormônio. Nesses casos, a pessoa que ingeriu iodo excesso desenvolve HIPERtireoidismo. Além disso, em alguns casos, dependendo da quantidade de iodo a que a tireoide foi exposta, pode haver dificuldades no diagnóstico preciso, já que o excesso de iodo pode interferir na correta interpretação de exames como a cintilografia, por exemplo. O quadro de hipertireoidismo induzido por iodo costuma durar de 1 até 18 meses e o tratamento consiste em evitar a ingestão de mais iodo, tratar os sintomas e a doença tireoidiana de base. Por fim, idosos apresentam risco maior de HIPERtireoidismo induzido pelo iodo pois frequentemente possuem nódulos ou disfunções tireoidianas assintomáticas.
Pessoas com tireoidite crônica ou de Hashimoto, especialmente se não tiverem diagnóstico, com história de tratamento com iodo radioativo no passado ou de cirurgia na tireoide, além dos pacientes com tireoidites silenciosa, subaguda ou pós-parto, podem desenvolver HIPOtireoidismo quando expostos a excesso de iodo. Estes pacientes, diferentemente das pessoas saudáveis, não conseguem escapar do efeito Wolff-Chaikoff. Isto é, o excesso de iodo acaba por inibir a produção de hormônio por parte da tireoide. Mulheres grávidas devem ter cuidado redobrado, já que o iodo atravessa a placenta com facilidade, e o excesso pode inibir a tireoide do bebê. Felizmente, o HIPOtireoidismo nestes casos costuma ter resolução rápida após suspensão da exposição ao iodo, a não ser que já houvesse doença tireoidiana não diagnosticada antes do início da suplementação.
Diversos estudos populacionais mostram que o consumo excessivo de iodo pode causar problemas à saúde, especialmente hipotireoidismo e tireoidite de Hashimoto. Na contramão da evidência científica exitem diversos defensores da suplementação de iodo para prevenção ou tratamento de doenças tireoidianas. Isto é um equívoco grave e um problema de saúde pública. Ora, se também há estudos mostrando que consumir açúcar em excesso causa obesidade e diabetes, por que estimular pessoas a fazer uso de um tratamento potencialmente deletério como a suplementação de iodo? É algo que nem a ciência consegue explicar...

Fonte: Iodine-induced thyroid dysfunction - UpToDate OnLine

Dr. Mateus Dornelles Severo
 Médico Endocrinologista
CREMERS 30.576 - RQE 22.991

domingo, 23 de outubro de 2016

Dieta do Jejum Intermitente: a solução ou mais uma dieta da moda?

A chamada "Dieta do Jejum Intermitente (JI)" tem recentemente ganhado popularidade como uma forma rápida e fácil de perder peso. Um sonho de consumo para todos que estão na batalha para emagrecer, não é mesmo? Os  divulgadores dessa prática defendem a ideia de ela que seria mais saudável do que as tradicionais dietas, por melhorar a qualidade de vida e prevenir doenças cardíacas, diabetes, câncer e demência. Mas será que isso é verdade? Será que essa dieta realmente funciona? E mais, será que é seguro submeter-se a períodos de jejum com o intuito de emagrecer?  Nessa dieta se faz jejum por 2 ou 3 dias na semana, não consecutivos ou alternados (alternate day fasting) e com duração que varia de 16 a 24 horas. Como os períodos longos de jejum poderiam ser difíceis de seguir,  criou-se uma estratégia que permite que haja o consumo de determinados alimentos, preferentemente gorduras e proteínas, por períodos limitados do dia (time-restricted feeding). Na prática, a hipótese é de que ao se fazer jejum, provoca-se uma resposta hormonal no corpo que resulta em queima de gordura e uma "limpeza" do organismo. Isso resultaria em perda de gordura corporal e manutenção da massa magra, aumento da longevidade, prevenção de câncer de mama, próstata e pâncreas, redução de doença coronariana e de demência. Mas um detalhe importante: esses resultados do JI foram na maioria observados em estudos com animais (roedores). Embora seja óbvio, é bom lembrar que não podemos garantir que o que se observa em animais será igual em humanos. Na verdade, existem poucos estudos bem feitos em seres humanos que avaliem os efeito do JI sobre a nossa saúde a  longo prazo.



Mas essas pesquisas nos dão algumas informações bem interessantes. Vamos ver o que a ciência séria nos diz? Vamos analisar 4 pontos: 1) funciona para emagrecer e melhora metabolismo? 2) é mais fácil de fazer ? 3) previne doenças? 4) é seguro a longo prazo? Primeiro, é possível sim perder peso quando se pratica o JI, obviamente decorrente da restrição calórica que é imposta. Tem se descrito reduções de 2,5 a 8% do peso corporal após 3 a 12 semanas de dieta de JI, mas com perda não somente de gordura, mas também de massa magra e água. Quanto aos efeitos sobre o metabolismo, os resultados são controversos. Enquanto alguns estudos relatam redução dos níveis de triglicerídeos e colesterol LDL (o "ruim") e aumento do HDL (o "bom"), outros mostram resultados contrários, com aumentos dos níveis de LDL provocado pelo JI, o que se conclui que é necessário se estudar mais a respeito. Em relação aos hormônios, quase nada se tem em humanos e praticamente todas as informações vem de estudos em roedores. Apenas um estudo mostrou que o  hormônio de crescimento (GH) se eleva de forma temporária quando se entra em jejum, o que seria uma resposta do corpo para auxiliar na preservação da massa magra e dos órgãos, queimando gordura para se obter energia nas primeiras 24 horas do jejum. Infelizmente não existe dados explicando como se comporta o GH com o passar dos dias e se esse efeito protetor do hormônio consegue se manter a longo prazo. Um segundo ponto seria o benefício sobre parâmetros de humor. E cá entre nós, manter o bom humor quando se está fazendo dieta é algo motivador! Muitas dietas são abandonadas por causa da irritação e do desconforto causados pela restrição de calorias. Embora um estudo controlado tenha sugerido redução de raiva, irritabilidade, insônia e confusão mental,  não ficou comprovado que realmente funcione dessa maneira.  Um terceiro ponto é sobre a prevenção de doenças quando se adere a regimes de JI. Em relação à longevidade, prevenção de câncer e de demência, não há nenhum dado em seres humanos que comprovem que a prática terapêutica do JI poderia ser benéfica. Na prevenção de doença cardíaca e diabetes, não temos ainda resultados dos chamados ensaios clínicos randomizados, que seriam os estudos que realmente mostrariam se há benefício comprovado. Mas uma análise com 648 indivíduos oriundos de 2 estudos observacionais mostrou uma redução significativa de doença coronariana e diabetes em uma população de religiosos americanos que praticavam jejum uma vez por mês.  Esses achados geram uma hipótese que favorece o JI como ferramente preventiva, mas infelizmente não fornecem elementos que comprovem que é seguro se submeter a essa prática para obter esses benefícios. E segurança é super importante quando se recomenda que alguém inicie uma dieta para emagrecer! Após 5-7 semanas, o jejum resulta em inanição, onde músculos e órgãos são queimados para manter o fornecimento de energia para o corpo. Sabe-se que uma perda de 40-60% do peso corporal pode resultar em sérios danos para a saúde e até morte. Embora uma dieta envolvendo JI não deveria causar esse risco, poderia causar danos quando praticada muito frequentemente ou por muitos dias consecutivos. São comuns queixas de dor de cabeça, ânsia de vômito, fraqueza, dores musculares, desmaios e desidratação. De forma preocupante, o jejum prolongado pode causar complicações graves, como arritmias cardíacas, deficiências de vitaminas e minerais, morte súbita durante o jejum e no início da realimentação. Em ratos, a aplicação de períodos de jejum resultou em alterações no coração (fibrose do miocárdio, aumento do diâmetro do átrio esquerdo e redução da reserva cardíaca) e esses achados devem ser levados em consideração quando se aplica esse tipo de dieta em humanos, pois não sabemos exatamente como ela funciona a longo prazo em nosso corpo. Da mesma forma, o JI poderia ser um facilitador para a perda de nutrientes, surgimento de desordens do comportamento alimentar (como anorexia e bulimia) e reduzir a imunidade.
Concluindo, com o que temos de evidências de estudos em seres humanos, podemos afirmar que a dieta do JI realmente emagrece, mas pode causar perdas grandes de massa muscular e água. O impacto do aumento do consumo de gordura para melhorar a tolerância do jejum e evitar essa perda não foi adequadamente estudado. O balanço entre o benefício a longo prazo da dieta de JI prolongado quando comparado com os danos da reduzida ingesta calórica  precisa ser melhor avaliado por mais estudos. Enquanto não tivermos mais resultados em seres humanos que acumulem evidências de que o JI é seguro para a saúde, não devemos recomendar essa prática. Devemos buscar saúde e não só resultados. É como diz o ditado popular: "por fora, bela viola; por dentro, pão bolorento". E cá entre nós, isso ninguém quer.


Dr. Eduardo Guimarães Camargo
Médico Endocrinologista
CREMERS 23.404 - RQE 17.086

Câncer de mama e diabetes mellitus

O Outubro Rosa é a época do ano em que se chama mais a atenção para o câncer de mama, a neoplasia maligna mais comum em mulheres. Cerca de 16 por cento das pacientes acometidas pelo câncer de mama também têm diagnóstico de diabetes mellitus. Mas será que o diabetes aumenta o risco ou piora o prognóstico do câncer de mama?



Há mais de um século sabemos que o diabetes mellitus está associado a alguns tipos de câncer, como pâncreas e endométrio. Contudo, a associação com o câncer de mama parece ser mais complexa e algumas questões permanecem sem respostas definitivas. Tanto o câncer de mama quanto o diabetes compartilham fatores de risco em comum. Obesidade e idade avançada aumentam a chance de desenvolver ambas as doenças. Existem pelo menos 3 possíveis mecanismos que ajudam a explicar uma possível associação do câncer de mama com o diabetes.
Pacientes diabéticas do tipo 2 apresentam resistência a ação da insulina e, pelo menos em fases iniciais da doença, excesso de produção de insulina. Existem receptores de insulina (IR) no tecido mamário. A ativação destes receptores pode ativar a proliferação desordenada de células mamárias em alguns casos. Alguns estudos sugerem uma maior expressão dos IR em tumores mamários.
Existe um segundo tipo de receptor, chamado receptor para o IGF1 (IGF1R), que também é capaz de estimular a proliferação celular em algumas circunstâncias. Este receptor tem uma semelhança de 55% com o receptor da insulina. Além disso, o IGF1R e o IR podem se hibridizar, isto é, os dois receptores podem se combinar em um só. Talvez os níveis elevados de insulina possam também estimular o IGF1R e levar a proliferação celular.
Por fim, o diabetes aumenta a produção de estrogênios e androgênios especialmente nas suas formas livres, pois diminui os níveis da SHBG, proteína que se liga a estes hormônios. Como o câncer de mama é sabidamente hormônio dependente, o diabetes poderia aumentar o risco desta neoplasia também por esta via.
Contudo, apesar de evidências de que a associação entre câncer de mama e diabetes exista, ainda não podemos afirmar que o diabetes por si só seja fator causal, já que, como dito anteriormente, as duas doenças compartilham fatores de risco. Além disso, o possível aumento de risco de câncer entre 10 e 20 por cento em mulheres diabéticas não vale para as pacientes com diabetes mellitus do tipo 1. Apenas pacientes com diabetes decorrente de aumento da resistência a ação da insulina (tipo 2 e diabetes gestacional) parecem ter aumento no risco de câncer de mama. 
De qualquer forma, as pacientes portadoras de diabetes mellitus de qualquer tipo devem mais do que qualquer mulher ser orientadas a participar dos programas de rastreamento do câncer com mamografia. Outro ponto importante é a assistência médica diferenciada no caso de diagnóstico do câncer de mama. As pacientes diabéticas têm potencial maior de apresentarem complicações cirúrgicas, da radioterapia e da quimioterapia. Logo, o contato direto e constante do mastologista, do oncologista e do endocrinologista é imprescindível para o sucesso do tratamento.

Fonte:
1- Wolf I, Sadetzki S, Catane R, Karasik A, Kaufman B. Diabetes mellitus and breast cancer. Lancet Oncol. 2005;6(2):103

Dr. Mateus Dornelles Severo
 Médico Endocrinologista
CREMERS 30.576 - RQE 22.991

terça-feira, 18 de outubro de 2016

Fatores de risco endocrinometabólicos do câncer de mama

Globalmente, o câncer de mama é a malignidade mais frequentemente diagnosticada e a principal causa de mortes por câncer em mulheres. Cerca de 50% dos casos de câncer de mama podem ser explicados por fatores de risco conhecidos. Estes por sua vez, podem ser modificados por mudanças socioambientais ou no estilo de vida. Discutiremos aqui os fatores de risco hormonais e metabólicos.


Algumas pessoas não sabem, mas o câncer de mama também pode acometer homens. Mas por que a doença maligna da mama é 100 vezes mais frequente em mulheres? Devido ao efeito dos estrógenos, hormônios produzidos pelo ovário. O estradiol, o principal estrógeno, exerce efeito proliferativo sobre a mama e isto, por si só, já explica grande parte desse aumento de risco. Mulheres que tiveram a primeira menstruação cedo e a última tarde, acabam tendo uma exposição maior ao estradiol, com consequente aumento do risco de câncer. Os estrógenos fornecidos por via oral, em terapias de reposição hormonal, também podem aumentar o risco, devendo ser indicados com cautela. Isso quer dizer que a mulher deve procurar baixar seus níveis de estrógenos? Não. Isso seria antifisiológico. Essas informações servem para justificar e individualizar os programas de rastreamento de câncer de mama. Conhecendo a paciente, melhoramos a conduta médica.
Outros hormônios que podem estar associados ao aumento de risco são a testosterona e a insulina. Contudo, mais estudos são necessários para que se possa estimar melhor o efeito destes.
O principal fator de risco metabólico para o câncer de mama é o excesso de peso. O aumento do risco fica em torno de 20% e é explicado pelo aumento da produção de estradiol nas células gordurosas a partir de precursores estrogênicos. Além disso, o excesso de peso causa resistência a insulina, com consequente aumento deste hormônio, que como dito anteriormente, também é suspeito de causar malignidade na mama.
O tipo de alimentação ainda gera debate. Apesar de ainda inconclusivos, alguns estudos sugerem que o consumo de uma dieta rica em gordura e carne vermelha e pobre em vegetais e derivados da soja, possa aumentar o risco de câncer de mama.
Do ponto de vista prático, o endocrinologista pode ajudar a diminuir a incidência de câncer de mama, ajudando suas pacientes a perderem peso através de uma alimentação saudável e incentivando a prática de atividades físicas. Além disso, a tão falada terapia de reposição hormonal, deve ser prescrita de maneira criteriosa e não para toda mulher após a menopausa.


Dr. Mateus Dornelles Severo
 Médico Endocrinologista
CREMERS 30.576 - RQE 22.991

quarta-feira, 12 de outubro de 2016

Síndrome dos ovários policísticos (SOP)

A síndrome dos ovários policísticos (SOP) acomete um grande número de mulheres em idade reprodutiva, chegando a 18% dessas e sendo considerada uma das doenças endócrinas mais comuns. Caracteriza-se basicamente por produção aumentada de hormônios, os androgênios, pelos ovários. Ao longo dos anos seu diagnóstico vem sofrendo modificações e, atualmente, se baseia nos critérios de Rotterdam, estabelecidos em 2004, onde a paciente necessita preencher pelo menos dois dos seguintes critérios: presença clínica e/ou laboratorial de excesso de androgênios, irregularidade menstrual e aparência policística do ovário ao exame de ultrassom. Além de preencher tais critérios, algumas doenças devem ser excluídas pelo especialista para determinar o diagnóstico de SOP, entre elas a hiperplasia adrenal congênita, a síndrome de Cushing, tumores secretores de androgênios e doenças tireoidianas.


Os androgênios são hormônios sexuais presentes tanto nos homens quanto nas mulheres e são produzidos principalmente pelas glândulas adrenais e gônadas, que são os ovários nas mulheres e os testículos nos homens. Quando a produção destes hormônios está em nível acima do normal no sexo feminino pode levar a características “masculinas”, como excesso de pelos, acne e até mesmo alopecia (calvície). Sabe-se hoje que o espectro da SOP é extremamente amplo, havendo desde mulheres sem estas características físicas de excesso de androgênios e que ovulam eventualmente, até casos mais severos, com acne intensa e aumento de pelos corporais em locais tipicamente masculinos (como buço e queixo), bem como infertilidade. 
Apesar das alterações físicas, da irregularidade menstrual ou da dificuldade para engravidar ser, em muitos casos, o motivo de procurar um especialista, a SOP envolve muitas outras condições. As mulheres acometidas apresentam uma prevalência muito maior de obesidade, resistência insulínica, colesterol elevado e hipertensão arterial, o que leva ao aumento de risco para doenças cardiovasculares a longo prazo. 
Cerca de 75% das mulheres com a síndrome estão acima do peso, sendo a obesidade presente em 30 a 50% delas. Além de elevar os riscos cardiovasculares, o excesso de peso piora também a própria evolução da SOP, dificultando a sua melhora clínica. A elevação de insulina no sangue, um importantíssimo fator de risco para o desenvolvimento de diabetes mellitus tipo 2, está presente em 80% destas pacientes obesas, mas acomete também até 40% das pacientes de peso normal. 
A primeira linha de tratamento deve sempre incluir mudanças de hábitos de vida, com alimentação saudável e prática de atividade física regular, independente do excesso de peso, e emagrecimento (quando indicado). O endocrinologista deve, além de estabelecer o diagnóstico correto, identificar as condições associadas e avaliar a melhor conduta para cada paciente. Além das mudanças comportamentais, o especialista avaliará a necessidade e a indicação de tratamento medicamentoso.

Referências:
Clapauch, R. Endocrinologia Feminina e Andrologia. Editora Gen. 2012.
Spritzer, PM. Primary and secundary prevention of metabolic and cardiovascular comorbidities in women with polycystic ovary syndrome. Rev Bras Ginecol Obstet. 2015, jan; 37(1):1-4.
Gody-Matos, AF. Endocardio Metabologia na Prática Clínica. Editora Gen. 2011.

Dra. Denise Rovinski
Médica Endocrinologista
CREMERS 34.953 - RQE 28.389

segunda-feira, 10 de outubro de 2016

Selênio e tireoide

O selênio é um oligomineral com várias funções biológicas e margem terapêutica estreita, isto é, as doses potencialmente tóxicas estão bem próximas das doses diárias recomendadas para o bom funcionamento no organismo. Logo, a suplementação pode ser útil para algumas pessoas com carência do mineral, mas pode trazer danos à saúde de muitas outras que não são deficientes.

A castanha-do-pará é uma importante fonte de selênio

Em seres humanos, a maior parte do selênio encontra-se ligado a aminoácidos: seleno-cisteína (forma ativa) e seleno-metionina (forma de estoque). Em suplementos, o selênio é disponibilizado na forma inorgânica livre. Frutos do mar, vísceras como fígado e rins, e castanha-do-pará são ricos em selênio. Uma única castanha-do-pará proveniente do Amazonas oferece em torno de 180 mcg de selênio, mais de 3 vezes a dose diária recomendada de 55 mcg. Dependendo do teor de selênio presente no solo, diferentes grãos podem ter diferentes concentrações de selênio. Após ingerido, o selênio é prontamente absorvido no duodeno (selênio inorgânico) e intestino delgado (seleno-metionina) independente dos níveis no sangue do indivíduo. Dentro do organismo, o selênio assume sua forma ativa e passa a participar de diferentes funções orgânicas. Já foram identificadas mais de 30 selenoproteínas das quais podemos destacar a glutationa peroxidase (antioxidante) e 3 formas da iodotironina deionidase tipo 2 (participa na fabricação dos hormônios da tireoide).
Diferentes estudos associam a deficiência de selênio a diversos problemas de saúde. Alteração no humor, disfunção muscular, alterações no sistema imunológico, câncer e doenças cardiovasculares. Mas quanto uma suplementação rotineira, ou mesmo o uso em pessoas saudáveis, pode ajudar, ainda precisa ser melhor estudado.
A tireoide é o tecido com maior concentração de selênio no corpo humano por expressar deionidades, que, como dito anteriormente, são selenoproteínas. Embora quantidades muito pequenas de selênio já sejam suficientes para manter a produção de hormônios tireoidianos, foi hipotetizado que os níveis de selênio possam ser importantes na regulação do sistema imunológico, que costuma participar no mecanismo de doenças como a tireoidite de Hashimoto(causa de hipotireoidismo) e a doença de Graves (causa de hipertireoidismo). Estudos pequenos e de curta duração mostraram que a suplementação de selênio foi capaz de reduzir os níveis de anticorpos (anti-TPO) além de modificar a estrutura ecográfica da tireoide em pacientes comtireoidite de Hashimoto. No entanto, tal suplementação não influiu na produção hormonal da glândula, isto é, do ponto de vista clínico, não ajudou em nada. Já em mulheres grávidas com elevação dos níveis de anticorpos, a suplementação de selênio ajudou a diminuir a chance de tireoidite pós-parto. Contudo, o estudo foi feito em uma população com alto risco de deficiência de selênio na Itália. Se esse benefício se estende a qualquer mulher em gestação, ainda não podemos afirmar. Por fim, o uso de selênio em pacientes com inflamação leve dos olhos associada ao hipertireoidismo, ou orbitopatia de Graves, parece ter um pequeno benefício.
Nos casos de uso excessivo ou abusivo, a intoxicação por selênio pode causar sintomas com náusea, vômito, queda de cabelo, alterações nas unhas, alterações do estado mental e doença dos nervos (neuropatia), além do aumento do risco de diabetes mellitus tipo 2.
Em resumo, apesar do selênio participar da fisiologia da glândula tireoide, até agora, os estudos não foram capazes de mostrar benefícios clínicos que justifiquem seu uso rotineiro. Considerando seu potencial de toxicidade, mais pesquisas precisam ser realizadas para identificar quem realmente poderá ser ajudado por este tipo de tratamento. 

Fonte: Drutel A, Archambeaud F, Caron P.Selenium and the thyroid gland: more good news for clinicians. Clin Endocrinol (Oxf). 2013 Feb;78(2):155-64.

Dr. Mateus Dornelles Severo
 Médico Endocrinologista
CREMERS 30.576 - RQE 22.991

domingo, 9 de outubro de 2016

Diabetes mellitus: uma doença que pode ser controlada

O diabetes mellitus é uma doença crônica, como a pressão alta, que tem uma origem genética, isto é, pode passar para família. O açúcar não causa o diabetes, mas o piora. O diabetes pode trazer complicações crônicas assustadoras, tais como a cegueira, o pé diabético com amputações, a necessidade de diálise e o maior risco de infartos. Essas complicações surgem quanto maior o tempo de diabetes e quanto pior estiver a glicose ("açúcar") no sangue do paciente. Porém, com o avanço do tratamento e do esclarecimento da população sobre o assunto, essas complicações estão diminuindo. Como médica especialista, por exemplo, já vejo menos casos assim. A realidade atual nos trouxe a possibilidade de um controle rigoroso da glicemia, ao ponto de o paciente poder "ficar sem diabetes", ou seja, controlar a doença sem deixá-la progredir.



O tratamento do diabetes hoje está muito mais fácil. O número de medicamentos diferentes disponível e o tratamento precoce tem melhorado a vida dos pacientes e diminuído as complicações. E o que é precoce? Alterações de glicemia com níveis maiores de 99 mg/dl em jejum (de 100 a 125 mg/dl) caracterizam risco de ser ou de vir a ser diabético. Nesse momento, a investigação adequada, se confirmado o diagnóstico do diabetes, já direciona a  modificação de estilo de vida e a possibilidade de medicamento. Para glicemia igual ou acima de 200 mg/dL em qualquer horário, o tratamento deve ser definido, e o seu endocrinologista é o melhor profissional para definir o seu tratamento, uma vez que cada um tem um perfil de medicamento ou associações deles para manejar melhor o seu diabetes. As outras doenças associadas ao diabetes, tais como hipertensão, alteração do colesterol e triglicerídeos, também devem ser muito bem tratadas. Devemos lembrar que, mesmo um paciente que faça insulina, se não fizer o mínimo de dieta sem açúcar, não há insulina ou médico que resolva! E as insulinas também evoluíram muito e são mais fáceis de aplicar, e as agulhas pequeninas são indolores à aplicação. A mensagem é simples: se o resultado do tratamento  controla a glicemia, compensa. São anos de vida que o paciente está conseguindo incorporar à sua vida. Então, não perca tempo. Invista em sua saúde e trate bem do seu diabetes.

Dra. Marcia Murussi
Médica Endocrinologista
CREMERS 19.973 - RQE 11.814

sábado, 8 de outubro de 2016

Endocrinologia, uma especialidade de doenças prevalentes

Todos sabem que o cardiologista cuida do coração, que o ginecologista cuida da saúde das mulheres e que o pediatra trata de crianças. Contudo, apesar de ser uma especialidade em franca ascensão, alguém, volta e meia, sempre pergunta: “O que faz o endocrinologista?”.
Endocrinologista é o médico especialista nos transtornos das glândulas endócrinas. Diferentemente das glândulas exócrinas, que secretam substâncias nas cavidades internas ou para o exterior do corpo, as glândulas endócrinas são responsáveis por secretar substâncias na corrente sanguínea. Essas substâncias são chamadas de hormônios.



Os hormônios são responsáveis por uma série de funções fundamentais para o nosso organismo. Entre estas funções estão a regulação do metabolismo, da reprodução, do crescimento e do desenvolvimento.
Distúrbios da secreção ou da ação dos hormônios podem levar a uma série de doenças. Entre elas, as mais comumente tratadas pelo endocrinologista são:
- obesidade;
- alterações do colesterol e triglicerídeos;
- diabetes mellitus;
- doenças da tireoide;
- distúrbios da puberdade e do crescimento;
- alterações menstruais e excesso de pelos em mulheres;
- osteoporose e outras doenças do metabolismo do cálcio;
- doenças das glândulas hipófise e adrenais;
- deficiência de testosterona em homens.
Os hábitos de vida modernos, caracterizados por alimentação inapropriada e sedentarismo, assim como o aumento da expectativa de vida, são os responsáveis pelos níveis epidêmicos de algumas destas doenças. Por exemplo, de cada 100 brasileiros, estima-se que em torno de 40 estejam acima do peso, 10 estejam obesos e 12 estejam diabéticos. Já o hipotireoidismo (diminuição da produção de hormônios pela glândula tireoide) pode acometer cerca de 10 em cada 100 pessoas.
Uma vez que o médico endocrinologista está sendo cada vez mais requisitado, é importante que todos conheçam a abrangência da Endocrinologia como especialidade. Isso fará com que a população saiba procurar por este profissional quando necessário, garantindo assim tratamento qualificado para os problemas em questão.

Fonte: http://www.drmateusendocrino.com.br/2012/11/04/endocrinologia-uma-especialidade-de-doencas-prevalentes/

Dr. Mateus Dornelles Severo
Médico Endocrinologista
CREMERS 30.576 - RQE 22.991